O resultado foi surpreendente e chocou os pesquisadores.
Por: Suellen Borelli
17 Dezembro 2016 às 17:47
No início do outono de 1971, uma equipe de pesquisadores da Universidade de Stanford, na Califórnia, resolveu desvendar os motivos que fazem das prisões lugares tão violentos e desumanos. Liderada pelo psicólogo Philip Zimbardo, a equipe simulou uma prisão nos porões do prédio do departamento de psicologia. Numa parte do subsolo, criaram três celas que usaram como laboratório para a experiência.
Cada cela foi construída exatamente no padrão das prisões de penitenciárias verdadeiras. Por meio de anúncios em jornais e emissoras de rádio, o grupo procurou voluntários para participar do estudo. O anúncio explicava que os recrutados participariam de uma prisão simulada durante duas semanas. Dos inscritos, setenta candidatos se qualificavam de acordo com o regulamento.
Destes, foram selecionados vinte e quatro, considerados os mais emocionalmente estáveis. Todos eram brancos, de classe média, em perfeito estado de saúde física e mental. Nenhum deles possuía antecedentes criminais. Por sorteio escolheram-se os agentes penitenciários e quem seriam os presos. A pedido dos pesquisadores, a polícia foi na casa dos voluntários.
Com um mandado de prisão em mãos, acusou-os de assalto a mão armada. Em seguida, os algemou e levou-os até o Departamento de Polícia. Lá, a equipe de pesquisa recolheu as impressões digitais dos detentos, e identificou-os com um número pelo qual passaram a ser chamados. Daquele momento em diante, eles ficaram sob a guarda dos agentes penitenciários.
Com olhos vendados, foram levados para a prisão simulada, no porão da universidade. Lá, vestiram o uniforme de presidiário e entraram nas celas, que permaneceram trancadas. Tudo para simular um fato real. Pelas câmeras escondidas, o professor Zimbardo e sua equipe acompanharam as ações no presídio.
O resultado foi surpreendente e chocou os pesquisadores.
A experiência rapidamente fugiu de controle. A partir dos primeiros contatos com os presos, os agentes tornaram-se autoritários, disciplinadores e agressivos. Os presos tornaram-se rebeldes e desobedientes, porém, totalmente submissos. Ainda na primeira noite, presos e agentes tornaram-se inimigos. Os agentes acordaram os presos de madrugada e os forçaram a fazer flexões de braço.
Depois, os obrigaram a ficar com o rosto voltado contra a parede e os agrediram com insultos verbais de toda ordem.
Pela manhã do dia seguinte, os presos se rebelaram. Em contrapartida, os guardas obrigaram os presos a tirarem a roupa e dispararam os extintores de incêndio contra eles.
No terceiro dia, um dos prisioneiros sofreu um ataque de histeria e foi libertado. No dia seguinte, foram liberados outros quatro. O motivo: “intensa depressão emocional, choro, ataques de fúria e ansiedade aguda”. Os presos restantes então decidiram fugir. A situação se agravou tanto, que Zimbardo e sua equipe resolveram abortar o projeto. A intenção era manter a experiência por duas semanas, mas a equipe foi forçada a concluí-la em apenas seis dias. Mesmo após sair da prisão, vários participantes apresentaram sérios distúrbios psicológicos.
Viktor Frankl deixou o campo de concentração em abril de 1945, logo após as tropas aliadas invadirem Berlin. Foram 910 dias de confinamento, tortura e trabalho forçado sob o comando dos nazistas.
Agora, reflita por um instante sobre a seguinte questão: como foi que Viktor Frankl (e tantos outros prisioneiros) — tendo perdido tudo, com todos os valores destruídos, sofrendo brutalmente de fome, de frio e de angústia, esperando a cada momento seu extermínio (a solução final), suportou níveis tão extremos de tortura, durante dois anos e meio, enquanto os voluntários do programa de Zimbardo não resistiram a uma semana, mesmo sem terem sido submetidos a nem parte dos horrores aos quais os primeiros foram expostos?
Se você analisar as duas situações, verá que a resposta é mais simples do que pode parecer. Os presos de Auschwitz sabiam que, para eles, só havia duas alternativas: a luta diária pela sobrevivência ou a morte. Além da sobrevivência, não existia mais nada. Essa objetividade lhes dava um foco específico, um objetivo determinado, uma missão diária a ser cumprida, ou seja: sobreviver.
Essa clareza de propósito os fazia suportar qualquer coisa. Por mais humilhante, desumana e intolerável que a situação se apresentasse, ela era melhor que a morte. Havia um objetivo maior: a sobrevivência. Com isso em mente, todas as atrocidades, em certo ponto, se tornavam suportáveis, pois elas estavam ainda abaixo do propósito.
O que ocorreu com os voluntários de Stanford foi exatamente o oposto. Ao contrário dos presos de Auschwitz, eles não tinham um foco específico. Estavam ali, mas opcionalmente conscientes que poderiam, ao seu alvitre, deixar a prisão, a qualquer tempo, sem nenhum impedimento. Em outras palavras, os presos de Auschwitz tinham um propósito claro e específico: sobreviver; enquanto os presos de Stanford tinham várias opções, inclusive a de deixar a prisão.
Essa constatação, por mais simples que possa parecer, é de importância fundamental porque nos revela uma coisa bastante óbvia, mas que insistimos em ignorar.
Ao contrário do que pensamos, o maior responsável pela mediocridade na vida das pessoas e empresas não é a falta de oportunidades, mas seu excesso.O excesso de oportunidades dissipa nossas energias e divide nossos pensamentos em tantos assuntos e em tantas direções distintas que, ao invés de criarmos um foco seguro, para nos fortalecer e servir de guia, nos tornamos vítimas da dúvida, da insegurança e, por consequência, da fraqueza. Todo dia, diante das circunstâncias impostas pelo ambiente que nos cerca, somos forçados a fazer inúmeras pequenas escolhas; estamos, o tempo todo, diante de um entroncamento de opções.
Se não tivermos um objetivo claro e específico que mantenha nosso foco, seremos inevitavelmente paralisados pela dúvida. Além disso, a própria constituição do ser humano, por natureza, é confusa, complexa, uma mistura de opções, desejos e contradições, nos lançando num mar de indagação permanente.
A cada momento surge algo novo, um canto da sereia, que parece sinalizar algo que não podemos deixar de fazer. Essa dúvida entre fazê-lo ou não cria uma espécie de letargia.
Precisamos organizar essa complexidade, lhe dar uma direção, um propósito, um guia que nos oriente diante das escolhas diárias. Exemplos do quanto estamos infectados pela Síndrome do Excesso de Oportunidade podem ser vistos em qualquer lugar. Observe por exemplo a orientação que é dada aos alunos na hora de prestar vestibular. Um das orientações mais comuns é que eles se inscrevam em duas ou três universidades e em cursos distintos.
Por quê? Porque caso não consiga ingressar no curso de sua preferência ele terá uma segunda opção, num curso menos competitivo. Se sua prioridade, por exemplo, é jornalismo, a segunda opção pode ser educação física, um curso bem menos competitivo e que, por isso, oferece uma maior possibilidade de ingresso.
O que está em jogo, nesse caso, é a negação dos talentos naturais do aluno. Por falta de persistência, ele acabará frequentando um curso para o qual não possui a mínima inclinação vocacional, e sua vida profissional será uma enorme frustração.
Trecho do livro: O óbvio que ignoramos de Jacob Petry
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